Escultura - Fernanda Gomes e os restos de Arte


Por Suzana Velasco
5.6. 2010

RIO - O corredor de entrada do apê se estreita com a pilha de gavetas e caixas que ela acha pela rua.


A maior parte da sala é ocupada por pedaços de madeira pendurados; paus que, unidos, viram uma escada; pregos nas paredes.

Um dos quartos guarda - e esconde - de casca de ovo a folha de ouro, passando por linhas de costura, moedas, colheres, papéis de cigarro e papéis de seda, clipes, fios de cabelo, copos quebrados, caixinhas de fósforo, pedras, ímãs.

- Tem gente que adora este quarto, mas tem gente que não consegue ficar muito tempo aqui - conta ela.

Fernanda é artista plástica. E o quarto repleto de objetos é um de seus dois ateliês. O cômodo ao lado é o outro, que ela chama de ateliê de pintura, com tintas quase sempre na mesma cor: branco. Fernanda acumula, mas para fazer desaparecer.

- Eu me lembro de uma exposição no MAM em que a Fernanda usou uns sabonetes gastos, já quase transparentes - conta a crítica de arte Ligia Canongia, que escreveu sobre algumas das primeiras mostras da artista, na virada para os anos 90.

- O trabalho dela é sempre muito delicado, quase desaparece para o olhar. Você precisa ficar atento, aguçar sua percepção, para identificar onde a obra acontece. E tudo é muito calcado na experiência do objeto vivido, já desgastado, com as marcas do tempo, as sujeiras.

E sempre foi assim, desde que, dividindo-se entre o trabalho como designer profissional e as experiências artísticas - que ainda não tinham esse nome -, Fernanda sentiu que precisava, como ela diz, "se desfazer" dos objetos que materializavam essas experiências.

Em 88, mandou uma proposta para o Projeto Macunaíma, da Funarte, e foi aceita. Era sua primeira exposição, e sua primeira individual. Fernanda não parou mais de acumular e se desfazer.
Globo Digital