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Por Luísa Roubaud,
Paula Varanda e
Tiago Bartolomeu Costa
24.12.2009
1 - Pitié!
De Alain Platel
Centro Cultural de Belém e Teatro Nacional S. João
O corpo definido por Alain Platel foi sempre capaz de absorver influências que vinham das margens do cânone, fazendo com que o sentido dado aos seus movimentos ultrapassasse em larga escala os princípios narrativos da coreografia.
Em "Pitié!" o seu discurso, muito graças a uma aliteração musical promovida pela composição de génio de Fabrizio Cassol, ganha uma outra dimensão, mais presente, menos dependente de fixadores referenciais, mais íntima porque mais crua.
O universo sugerido por São Mateus transforma-se em carne dorida e faz por recentrar no corpo a relação de forças existente entre a ascese e o efémero.
Grande fresco coreográfico em que convivem saudavelmente o herético e o dogmático, "Pitié!" permite a Platel centrar-se não apenas na generosidade expressiva dos diferentes corpos, capazes de carregar em cada uma das frases múltiplos sentidos que não se contraem nas lógicas retóricas da equivalência entre ilustração e metáfora, mas também, e sobretudo, de definir um universo onde o mistério da fé (e da poética da dança) se obriga a uma inscrição pragmática no real. Tiago Bartolomeu Costa
2 - So Solo
De Clara Andermatt
Culturgest
Andermatt expressa com disponibilidade notável - como actriz e como bailarina - uma grande diversidade de registos, emoções, eventos e ideias adjacentes à temática da solidão: questão existencial, prisão fácil e comum, com possibilidades de evasão. É uma construção complexa, onde diversas áreas artísticas e modos de operar convergem intencionalmente, produzindo com sucesso um discurso claro numa atmosfera de ambiguidade e mistério, que convida o espectador para associações criativas constantes. Paula Varanda
3 - Orfeu e Eurídice
De Marie Chouinard
Teatro Carlos Alberto e Teatro Viriato
Chouinard apropriou-se do mito grego e fez um espectáculo ousado, exuberante e visceral, com uma forte dimensão estética e uma ágil sobreposição de conceitos habitualmente opostos.
A linguagem ecléctica e construída ao detalhe - de que participam o grotesco, o erótico, o lúdico e o espartano - confirma a originalidade da coreógrafa, o seu domínio excepcional do movimento, e uma grande capacidade de expressar imagens e emoções fortes com o corpo.
Cheia de arte, é uma obra de entretenimento puro com enorme impacto. P.V.
4 - Parades & Changes, Replays
De Anne Collod e convidados
Auditório de Serralves e Culturgest
Quando, em 1965, a coreografa americana Anna Halprin estreou "Parades and Changes" na cena alternativa da dança de então, não imaginaria que a peça iria tornar-se um ícone do pós-modernismo e ainda menos que, quase meio século depois, viesse a ser revisitada. Entre a reconstituição "arqueológica" e a reinterpretação livre, este "replay" de Anne Collod possui um duplo mérito: celebrar uma figura seminal, menos lembrada, dos alvores daquele movimento, e evidenciar a genealogia subjacente às premissas que operam, ainda hoje, em muita da dança actual. Luísa Roubaud
5 - Magyar Tàncok
De Eszter Salamon
do CAORG (Festival Materiais Diversos)
Com base em filmes de recolhas etnocoreográficas, trechos dançados, música tradicional húngara e depoimentos biográficos, Eszter Salamon desenvolveu uma conferência dançada que se revelaria um verdadeiro ensaio antropológico sobre as relações complexas entre a cultura expressiva tradicional e a contemporaneidade.
"Magyar Tàncok" é esta proeza: uma peça simultaneamente didáctica e profunda, rigorosamente documentada e acessível, permitindo uma reflexão com níveis leitura e de questionamento adequados a diferentes graus de cultura artística. L.R.
6 - O Aqui
De Ana Rita Barata
Teatro Camões
Aposta arrojada e generosa, "O Aqui" desenvolve-se num todo coerente onde sobressaem volumes e imagens atraentes que modificam o espaço, relações de risco e afecto que transpiram uma cumplicidade comovente do elenco, mistura e validação de vocabulários e sucessão lógica e bem ritmada de secções.
Ana Rita Barata vai muito além do poder inseparável que este trabalho tem de mudar a visão da sociedade sobre pessoas com necessidades especiais e de criar oportunidades únicas de visibilidade e desenvolvimento. P.V.
7 - Gustavia
De La Ribot e Mathilde Monnier
Culturgest
Juntas na autoria e na interpretação desta peça, La Ribot e Monnier assumem com humor hilariante uma exploração burlesca de assuntos da arte e da mulher.
Numa cena despojada, enquanto o som evoca cuidadosamente lugares e desperta a imaginação, o movimento baseia-se na gestualidade de corpos muito eloquentes.
Com uma elegância desarmante e uma determinação implacável, critica-se um quotidiano feminino extenuado pela junção de funções políticas, trabalhos domésticos e imagens de beleza e sexualidade. P.V.
8 - 36, Avenue Georges Mandel
De Raimund Hoghe
Auditório de Serralves
Com "36, Avenue Georges Mandel", morada onde Maria Callas morreu, em Paris, Raimund Hoghe encontra o espelho dialéctico ideal para regressar ao registro mais intimista que caracterizou o início da sua obra.
O pendor biográfico confunde-se com a grande história e a narrativa mitológica num exercício poético ímpar, em que a tragicidade de Callas é o ponto de partida para uma coreografia sensitiva e invisível. A voz, e sobretudo o corpo de Callas, aparecem como sombras que prolongam o corpo e o olhar de Hoghe, intenso, emotivo e sombrio.
9 - L'Aprés-midi, Um Solo para Emmanuel Eggermont
De Raimund Hoghe
Teatro Virgínia (Festival Materiais Diversos)
Prosseguindo uma reflexão sobre a relação entre a música e a dança, Hoghe parte da partitura de Debussy para criar uma peça para um intérprete exímio, Emmanuel Eggermont.
O mito do fauno (e o lastro deixado por Nijinski na versão original) surge aqui como hipótese de reinterpretação de uma ideia cara ao coreógrafo alemão: o corpo como elemento indutor de uma poética fétichista.
Criando uma tensão na qual o espectador se vê envolvido e da qual se torna cúmplice, "L'Après-midi" é um raro momento de análise detalhada das partituras que o corpo constrói, em ligações arbitrárias mas complementares. T.B.C.
10 - Maiorca
De Paulo Ribeiro e Pedro Burmester
Centro Cultural Olga Cadaval
Foi em Maiorca, no Inverno de 1838-39, que Chopin compôs a maior parte dos 24 Prelúdios.
Na sua aparência fragmentária e inacabada, existe uma antevisão de modernidade que os torna apetecíveis para a dança contemporânea. A peça de Ribeiro franqueia esse interstício e cria um belíssimo diálogo, um eloquente jogo de aproximação e de distância entre dança e música, que se oferecem, generosa e mutuamente, espaço de respiração.
O universo autoral do coreógrafo abre-se a Chopin e constrói uma poética própria no vértice da intemporalidade do compositor, deixando bem à vista o elo que o liga à contemporaneidade. L.R.
http://ipsilon
Com base em filmes de recolhas etnocoreográficas, trechos dançados, música tradicional húngara e depoimentos biográficos, Eszter Salamon desenvolveu uma conferência dançada que se revelaria um verdadeiro ensaio antropológico sobre as relações complexas entre a cultura expressiva tradicional e a contemporaneidade.
"Magyar Tàncok" é esta proeza: uma peça simultaneamente didáctica e profunda, rigorosamente documentada e acessível, permitindo uma reflexão com níveis leitura e de questionamento adequados a diferentes graus de cultura artística. L.R.
6 - O Aqui
De Ana Rita Barata
Teatro Camões
Aposta arrojada e generosa, "O Aqui" desenvolve-se num todo coerente onde sobressaem volumes e imagens atraentes que modificam o espaço, relações de risco e afecto que transpiram uma cumplicidade comovente do elenco, mistura e validação de vocabulários e sucessão lógica e bem ritmada de secções.
Ana Rita Barata vai muito além do poder inseparável que este trabalho tem de mudar a visão da sociedade sobre pessoas com necessidades especiais e de criar oportunidades únicas de visibilidade e desenvolvimento. P.V.
7 - Gustavia
De La Ribot e Mathilde Monnier
Culturgest
Juntas na autoria e na interpretação desta peça, La Ribot e Monnier assumem com humor hilariante uma exploração burlesca de assuntos da arte e da mulher.
Numa cena despojada, enquanto o som evoca cuidadosamente lugares e desperta a imaginação, o movimento baseia-se na gestualidade de corpos muito eloquentes.
Com uma elegância desarmante e uma determinação implacável, critica-se um quotidiano feminino extenuado pela junção de funções políticas, trabalhos domésticos e imagens de beleza e sexualidade. P.V.
8 - 36, Avenue Georges Mandel
De Raimund Hoghe
Auditório de Serralves
Com "36, Avenue Georges Mandel", morada onde Maria Callas morreu, em Paris, Raimund Hoghe encontra o espelho dialéctico ideal para regressar ao registro mais intimista que caracterizou o início da sua obra.
O pendor biográfico confunde-se com a grande história e a narrativa mitológica num exercício poético ímpar, em que a tragicidade de Callas é o ponto de partida para uma coreografia sensitiva e invisível. A voz, e sobretudo o corpo de Callas, aparecem como sombras que prolongam o corpo e o olhar de Hoghe, intenso, emotivo e sombrio.
9 - L'Aprés-midi, Um Solo para Emmanuel Eggermont
De Raimund Hoghe
Teatro Virgínia (Festival Materiais Diversos)
Prosseguindo uma reflexão sobre a relação entre a música e a dança, Hoghe parte da partitura de Debussy para criar uma peça para um intérprete exímio, Emmanuel Eggermont.
O mito do fauno (e o lastro deixado por Nijinski na versão original) surge aqui como hipótese de reinterpretação de uma ideia cara ao coreógrafo alemão: o corpo como elemento indutor de uma poética fétichista.
Criando uma tensão na qual o espectador se vê envolvido e da qual se torna cúmplice, "L'Après-midi" é um raro momento de análise detalhada das partituras que o corpo constrói, em ligações arbitrárias mas complementares. T.B.C.
10 - Maiorca
De Paulo Ribeiro e Pedro Burmester
Centro Cultural Olga Cadaval
Foi em Maiorca, no Inverno de 1838-39, que Chopin compôs a maior parte dos 24 Prelúdios.
Na sua aparência fragmentária e inacabada, existe uma antevisão de modernidade que os torna apetecíveis para a dança contemporânea. A peça de Ribeiro franqueia esse interstício e cria um belíssimo diálogo, um eloquente jogo de aproximação e de distância entre dança e música, que se oferecem, generosa e mutuamente, espaço de respiração.
O universo autoral do coreógrafo abre-se a Chopin e constrói uma poética própria no vértice da intemporalidade do compositor, deixando bem à vista o elo que o liga à contemporaneidade. L.R.
http://ipsilon