Clube dos Poetas Vivos (Portugal)


POETAS DESCONHECIDOS,
ESQUECIDOS,
TÍMIDOS,
ADORMECIDOS,
COM MAIS VALOR
QUE O PESSOA. OU NÃO.

(ATENÇÃO: ENTRADA PROIBIDA
A ROMANCISTAS, PROSADORES
E PRINCIPALMENTE RIMADORES
CRUZADOS E/OU EMPARELHADOS!)


AS IDEIAS

É um alívio:

Pedem-me para dizer
que tenho ideias repletas de vento
à solta na cabeça.
São papagaios de papel
coloridos nas mãos de crianças a correr;
E agora ideias coloridas por crianças
com cabeças de papel
que voam como papagaios
e com as mãos na cabeça descubro:

há ideias soltas neste papel
- incendiado
e no mesmo instante
as cabeças das crianças
que não têm balões
(têm papagaios nas mãos pesadas)
incendeiam o vento
com as suas cabeças coloridas
mas é a mim que soltam
já sem grandes ideias
sobre papagaios ou balões
mas continua a ser um alívio
ter na cabeça esta criança
que no papel faz correr palavras
que não têm mais que alguma cor
e que ainda assim de tão pesadas
o vento não levará.


AUTOPSIALMA

Assim sublime.
Os corpos alinhavados por dentro
todos em espasmos horizontais
e somos projectados para dentro
de outros corpos fechados cuspidos depois
ainda quentes, quebrados
com a carne ainda em movimento.
Somos sublinhados ainda assim rasgados à luz.

Temos tudo aqui:
os teus subúrbios, os lábios
puxados para fora guardados
em caixas pequenas.
Ficam quase mudos
e os olhos espetados com agrafos.
Tudo tão real.
Os pés cortados
a alma pendurada enfim
em arames.

Estou quase lá
com esta subtileza:
supõe que sou um anjo
a quem deram uma navalha
e só com ela te apercebeste de mim
como se eu não existisse para lá da lâmina
e foi no consentimento que pecámos a dois.

Eu a matar-te
e tu a deixar morrer
as coisas todas em ti.

Gervaz, Março 2004

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